O “reflexo” é uma reação involuntária, que pode ser sensorial ou motora, a qualquer estímulo do ambiente ao nosso redor.
Assim como um goleiro treina para desenvolver seus reflexos ao ponto de conseguir agarrar uma bola que voa em sua direção (ou não) a uma velocidade muito grande, na música nós também precisamos desenvolver alguns reflexos.
Explicando: se um músico consegue tocar uma melodia que está escrita em uma partitura, ele está usando um reflexo semelhante ao da leitura de textos comuns. Lê exatamente o que está escrito e reproduz aquela ideia.
Na improvisação, porém, o reflexo é um pouco diferente porquê, muitas vezes, o que está escrito são basicamente as cifras que apontam a harmonia a ser seguida. Assim:

Dessa forma, o improvisador precisa conhecer bem o que cada símbolo quer dizer. Não apenas qual acorde ele aponta, mas sim toda a estrutura interna que é representada ali.
Falando sobre a minha experiência, aprendi a tocar saxofone lendo partitura e já tinha um bom reflexo com ela. Eu pegava uma partitura nova e, com um pouco de leitura, já era capaz de tocar sendo acompanhado por um metrônomo ou uma banda. Mas fiquei muito frustrado ao perceber que não tinha a mesma habilidade com as cifras. Mesmo colocando-as dentro de um pentagrama, eu não conseguia acompanhá-las no tempo certo e sempre me perdia tocando. Quando eu estava olhando pra um compasso, a música já estava em um ou dois compassos a frente.
Isso acontecia porquê uma coisa é ler a partitura tradicional, onde nos acostumamos a saber que cada compasso está preenchido milimetricamente. Outra, é pensar nos tempos da música sem o desenho das figuras que representam cada tempo, apenas olhando para o símbolo do acorde em cada compasso (por vezes mais de um acorde por compasso).
Eu contornei este problema há muito tempo e, por entender que é algo importante a ser trabalhado, esse é o 1º ponto que trabalho com meus alunos no Programa de Improvisação Musical Prática (ProIMP). Os alunos aprendem as cifras e depois já vão exercitar a leitura com um acompanhamento. Não é uma coisa complicada, porém exige prática. É necessário que o improvisador tenha o hábito de, olhando para a cifra, ter a ideia do tempo passando e acompanhar as mudanças de acorde junto com os compassos. E isso é algo exercitável que podemos desenvolver tranquilamente enquanto adquirimos a habilidade de improvisar.
Minha sugestão de estudo é:
Com um compasso definido (4/4, 3/4 ou 2/4), escreva uma sequência de acordes e toque diferentes graus dessa sequência. Uma vez somente as fundamentais, outra somente as terças, depois as quintas e as sétimas. É muito importante que seja uma sequência aleatória de acordes. Por que aleatória? Porque o cérebro sempre busca padrões e, quando encontra, você não conseguirá mais pensar no exercício, só tocará o padrão que analisou. Um exemplo:
Ao colocar as cifras no ciclo de quartas “C, F, Bb, Eb, Ab…” se determinar que tocará as terças maiores de cada um desses acordes (olhando a cifra dos acorde e tocando as terças deles), elas também estarão distantes de um acorde para o outro por uma quarta justa. Então, se já conhecer intervalos, tocará pensando em intervalos de quarta, que serão “E, A, D, G, C…” respectivamente e, com isso, não estará pensando em quem são as terças maiores dos acordes, mas sim, em intervalos. Por isso, a cifra precisa ser aleatória para não gerar essas armadilhas.
Também é preciso ter consciência de que é normal, ao praticar exercícios assim, nos depararmos com dificuldades com algumas cifras, ou muitas. Por isso, em um primeiro momento, comece sem metrônomo. Vá se familiarizando e, ao perceber lugares que tem dificuldade, vá direto em cima dos problemas. Recomendo inclusive que faça anotações sobre os acordes em que tem problemas e estude-os à parte. Isso fará muita diferença. Somente depois, comece a praticar direto com o metrônomo ou com algum acompanhamento.
Com o passar do tempo, pratique o máximo o possível de variações de “duração de acordes”. Coloque no seu exercício acordes que preencham um compasso inteiro, depois dois acordes por compasso, depois um acorde por tempo. Tudo isso irá melhorar o seu reflexo.
Com essas dicas, tenho certeza que desenvolverá um excelente reflexo sobre as cifras e isso será um problema a menos na hora de improvisar.